Um estudo que mede a qualidade de vida das cidades das regiões metropolitanas brasileiras aponta que, em Minas Gerais, os municípios mais próximos de Belo Horizonte apresentam índices melhores em relação aos demais.
O levantamento, realizado por pesquisadores da Universidade Federal do ABC e da Universidade Presbiteriana Mackenzie, elaborou o Índice Multidimensional de Qualidade de Vida Municipal, que, com base em dados do censo demográfico do IBGE, leva em conta seis indicadores: renda, educação, infraestrutura, sobrevivência (um indicador da área de saúde), habitação e acesso à informação. Os resultados foram publicados no livro “Qualidade de Vida e Desigualdades nas Metrópoles Brasileiras”.
A cidade com melhor qualidade de vida é Belo Horizonte, seguida de Contagem, Nova Lima e Raposos. A posição geográfica das cidades com índices elevados, mais próximas da capital, é um padrão que se repete também em outras regiões metropolitanas.
“Belo Horizonte, assim como São Paulo, tem uma zona central onde se concentram riqueza e produção, o que torna o terreno, o espaço, mais caro, fazendo com que as empresas busquem no cinturão do entorno da região locais para instalar suas partes produtivas”, explica a professora Mônica Kuwahara, da Universidade Federal do ABC. “Em São Paulo existe o ABC. No caso de Belo Horizonte, temos Betim e Contagem, que desempenham mais ou menos a mesma função”, completa.
Segundo o professor da Mackenzie e coautor do livro, Vladimir Maciel, as áreas centrais oferecem melhores condições de infraestrutura, transporte e serviços, concentrando classes de maior renda. Enquanto isso, pessoas de baixa renda que não conseguem se manter nessas áreas migram para municípios periféricos, onde o custo de vida é mais baixo.
“E é barato por quê? Porque a acessibilidade é ruim e a infraestrutura é precária. Este é um padrão que é comum nas metrópoles brasileiras. Um padrão centro-periferia”, afirma. “Belo Horizonte, Nova Lima, Contagem: aqui está a área com infraestrutura, aqui estão o dinheiro e os municípios com melhores condições para os moradores”, completa.
Outro fator decisivo apontado pelos pesquisadores para a qualidade de vida é a relação com a atividade mineradora. “Os municípios que estão vinculados muito fortemente com a atividade mineradora, que gera renda, emprego e salário formal, carteira assinada, têm melhores condições tributárias, porque arrecadam Cfem (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais), então conseguem manter uma infraestrutura melhor e também ter uma população de maior renda”, afirma Vladimir Maciel.
A professora Mônica Kuwahara também aponta a correlação entre a mineração e os municípios com maior pontuação no índice de qualidade de vida. Porém, faz uma ressalva: o mesmo impulso responsável pelo desenvolvimento econômico desses municípios ajuda a explicar a desigualdade presente na região metropolitana de Belo Horizonte.
“Tem um histórico da ocupação do solo e da apropriação da riqueza dessas minas que vai se perpetuando ao longo do tempo. Com isso, as medidas mitigadoras dos danos ambientais e sociais da concentração dessas atividades ficam cada vez mais difíceis”, explica.
“Ao longo do tempo vai ficando mais caro corrigir os problemas ambientais da extração. Isso é uma particularidade da região de Belo Horizonte. Ela é afetada positiva e negativamente por tudo o que acontece na região das minas”, diz, lembrando as tragédias ambientais de Mariana e de Brumadinho.
Eixo Norte
Na década passada, houve um esforço deliberado do governo de Minas Gerais para incentivar o desenvolvimento do eixo Norte da região metropolitana: recuperação do Aeroporto Internacional de Belo Horizonte, em Confins, construção da Linha Verde e da Cidade Administrativa.
Porém, apesar do investimento, os índices de qualidade de vida das cidades que compõem o eixo não melhoraram.
“Se a gente não tivesse Itabira, que ainda tem a mineração, e Sete Lagoas, com siderurgia, o que a gente vê basicamente é que a região Norte é uma região de concentração da pobreza”, afirma Maciel.
“Se você olhar a orientação nos últimos anos, desde o governo Aécio Neves, passando pelo Anastasia, que teve um investimento público de ‘vamos colocar um vetor no eixo Norte’, com o próprio aeroporto de Confins e a Cidade Administrativa, foi muito dinheiro, mas insuficiente para pegar a periferia desse Norte. Ele para no meio do caminho. Tem mais coisa ali para acontecer”, conclui.
Diferença do IDH
O Índice Multidimensional de Qualidade de Vida Municipal tem a mesma raiz teórica do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), métrica utilizada para comparar as realidades de diferentes países.
Porém, para que seja capaz de abranger todos os países do mundo, o IDH foi restrito a três variáveis: renda per capita, educação e expectativa de vida. Com o objetivo de criar um índice mais compatível com a realidade brasileira, Mônica e Vladimir optaram por acrescentar mais variáveis.
“O problema é que, se a gente for olhar para a realidade brasileira, tem que pensar em outras coisas. Por exemplo, a chance de uma pessoa que mora em um município periférico por conta das condições de infraestrutura, da moradia que ele tem, de conseguir melhorar de renda, progredir, é baixa”, diz Vladimir Maciel. “Essas coisas o IDH não capta. Então, quando a gente coloca mais dimensões, é na tentativa de aproximar mais os problemas que são importantes para a gente”.
O Índice Multidimensional de Qualidade de Vida Municipal foi aplicado sobre duas bases de dados: as dos censos demográficos do IBGE de 2000 e de 2010. Segundo Maciel, as conclusões permanecem relevantes porque muitas das dimensões são estruturais.
“São dimensões que variam pouco ao longo de dez anos. A renda oscila muito, mas a expectativa de vida tem a ver com uma melhoria do SUS, das condições de saneamento. Saneamento e infraestrutura, quando você investe, não é do dia para a noite. É ao longo de uma década. Por isso que, apesar de ser com base no censo de 2010, ainda é válido para a gente olhar e refletir sobre esses municípios”, conclui o pesquisador.
Belo Horizonte, assim como São Paulo, tem uma zona central onde se concentra riqueza e produção", diz professora
Foto: Moisés Silva / O Temp
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