Fotos: Divulgação Imprensa
A partir deste sábado, 26 de março, às 16h, o fotógrafo Guto Muniz disponibiliza para o público acervo inédito que traz espetáculos registrados pelo artista em filme fotográfico, ainda nos anos 80 e 90. As fotos serão publicadas no site Foco in Cena, criado pelo fotógrafo em 2012, com o objetivo de documentar a memória das artes cênicas brasileiras e internacionais. No mesmo dia e horário, o artista promove, em BH, na Zap 18 (Bairro Terezinha), um encontro aberto ao público, com artistas referência da cena mineira, como Fernanda Vianna (Grupo Galpão), Suely Machado (1º Ato), Pedro Paulo Cava (Teatro da Cidade) e Marcos Coletta (Quatroloscinco + CPMT – Centro de Pesquisa e Memória do Teatro), para bate-papo gratuito sobre a memória do teatro mineiro. Este projeto possui, entre outras medidas de acessibilidade para cegos e surdos, interpretação em libras, legendas automáticas em texto, menção nas redes da hashtag para cego ver, peças de divulgação com contrastes de claro e escuro, e texto ampliado nas peças de divulgação. O projeto Teatro em BH no Final do Século XX – digitalização do acervo de Guto Muniz é realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte.
No final da adolescência, Guto Muniz abandonou o sonho de se tornar arqueólogo. Com a entrada na faculdade, descobriu a paixão pela fotografia e pelo teatro. Era meados de 1980, quando teve contato no curso de publicidade com a disciplina de ‘Teatro’. Na época, havia assistido a poucas peças, mas foi tomado pelos encantos do teatro, chegando a montar um grupo amador com os colegas. Depois veio a ‘Expressão Plástica’, uma matéria com ênfase na fotografia. Comprou então sua primeira câmera e tornou-se monitor no laboratório de fotografia da faculdade. “Foi quando registrei meu primeiro espetáculo teatral: Antígona (1987), da Cia. Sonho & Drama. A conexão foi tanta que claramente me imaginei fazendo isso por toda a minha vida. Acho que, inconscientemente, percebi que teria um valor grande no futuro”, conta.
Desde então, Guto fotografou quase 2.000 espetáculos, sendo cerca de 300 nacionais (exceto MG), 300 internacionais e mais de 1000 trabalhos locais. Até 2012, parte desses registros ainda não era conhecido do público. Na época, Guto decide, então, lançar o Foco in Cena, com o objetivo de reunir seu acervo digital realizado desde 2001. Agora, para celebrar os 10 anos do portal, o artista disponibiliza, em primeira mão, a digitalização e disponibilização de um acervo raro – com grande importância histórica para as artes cênicas mineiras e nacionais – que abrange toda a primeira fase de seu trabalho, registrada em papel fotográfico ainda no século XX. “Fotografava apenas com filmes preto e branco. No início de 1990 começou a demanda pela fotografia colorida para os jornais e passei a usar filmes coloridos. Já na segunda parte da década, veio a necessidade de transitar para a fotografia digital. Como os equipamentos ainda eram caros, continuei fotografando em filmes e digitalizando as fotos em scanners específicos para a finalidade”, relembra.
É na virada do século, em 2001, que Guto adquire sua primeira câmera digital. Apesar de ter encarado com facilidade a mudança, o fotógrafo ressalta que a experiência anterior com o papel fotográfico faz muita diferença no seu trabalho hoje. “Fotografar em filme me ensinou a necessidade de me concentrar nos espetáculos e esperar o momento certo de bater a foto. Levei isso para o digital e, rapidamente, entendi que, apesar de não ter mais o custo dos filmes e o limite do número de fotos que eles me propiciavam, era o mergulho em cada trabalho que me dava ou daria o resultado que eu precisava, e não o tipo de equipamento que eu usava”, explica.
Atualmente, antes de fotografar um trabalho, Guto faz um estudo sobre o espetáculo. Procura por informações e imagens de trabalhos anteriores da companhia, dos artistas e da direção. “Evito ver fotos já produzidas daquele espetáculo, pois não quero ser conduzido por elas. Prefiro criar imagens na minha mente em cima do que pesquisei e deixar que o espetáculo se apresente para mim”, diz. No dia da apresentação, chega ao local com uma hora de antecedência. “Converso com a equipe, me ambiento com o espaço, passo a luz com o responsável pela iluminação, entendo qual o melhor local para me posicionar e que tipo de equipamento devo usar”, diz.
Nesses 35 anos, Guto extrapolou o palco, e passou a registrar também o processo criativo de diversas companhias. “Sempre que possível, participo de ensaios e acompanho processos. Para ele, não é o olhar que amadurece, “mas nossa bagagem cultural que aumenta. E isso faz com que muitas vezes encontre em meus arquivos imagens maravilhosas, feitas há muitos anos e que, naquele momento, não me despertaram muita atenção. Também porque muitas delas carregam um valor histórico que antes não tinham”, conclui.
A diretora e atriz Yara de Novais, radicada em São Paulo, dirigiu diversos trabalhos em Minas fotografados por Guto Muniz. Entre os mais recentes, “Tio Vânia” (Grupo Galpão) e “Noturno” (Teatro Invertido) tiveram seus processos criativos registrados. “Escolho com muito cuidado quem será o fotógrafo que vai fazer parte da equipe, porque ele também é um criador daquele espetáculo, afinal, registra a obra para além da sua efemeridade”. Segundo Yara, o fotógrafo de cena não é um espectador comum. “É como um espectador criador, um espectador que vai dar potência àquela ação, que vai aumentar aquela ação na imobilidade da fotografia. Essa contradição bonita e poética que a fotografia pode nos dar. Ela faz da imobilidade sua grande ação”. No caso de Guto Muniz, “sempre fiquei muito encantada. É como se eu fosse reapresentada àquilo que eu achava que já conhecia. Pela fotografia que ele fez de determinado espetáculo, a gente pode voltar e interferir naquela obra”, afirma.
Muitas companhias mineiras também reúnem, em seu acervo de imagens, fotografias do artista, de diversas peças. O Grupo Galpão talvez seja uma das parcerias mais antigas do fotógrafo, que segundo Eduardo Moreira, começa em 1990, com a estreia de ‘Álbum de Família’. “Guto foi o fotógrafo que mais registrou nossos espetáculos ao longo desses 30 anos. A referência visual que o trabalho do Guto nos revela, nos ajuda a entender o caminho do nosso próprio trabalho”, afirma o ator.
O diretor Pedro Paulo Cava se lembra de quando Guto Muniz chegou ao teatro da Cidade nos anos de 1990 para fotografar ‘Mulheres de Holanda’. “Ele veio mudar completamente o panorama da fotografia no teatro brasileiro. Na época, a gente fazia foto para divulgar. Já Guto faz fotografia porque considera isso uma arte. Ele tem o talento de capturar emoções, luz, sombra. Ele chega com um olhar totalmente diferente. A fotografia passa a integrar o seu acervo, e não somente o acervo da imprensa. Um artista genial, que gosta do que faz. Uma foto para ampliar e botar na parede. Isso é Guto Muniz”, afirma.
‘Antígona’, ‘A Casa do girassol vermelho’, ‘Esta noite mãe coragem’, ‘Alma boa de Setsuan’ são alguns dos espetáculos fotografados por Guto, com direção ou atuação de Cida Falabella. “São peças que se revelaram pelas fotos do Guto. A gente costumava dizer que uma montagem não estava pronta enquanto não fosse fotografada pelo Guto, porque ele nos devolvia um pouco do que a gente gostaria que aquele espetáculo fosse, em termos imagéticos. Ele revelava o espetáculo, atrás do espetáculo”. Segundo a artista, Guto sempre fotografou com muito afeto e respeito pelas artes cênicas brasileiras. “É muito bom poder contar com esse olhar e saber que a arte tão efêmera do teatro, se inscreve no tempo através da fotografia e que tudo isso agora está bem guardado, num acervo tão bonito, à disposição dos novos estudantes e apaixonados do teatro e das artes cênicas em geral”, celebra.
SERVIÇO
Memórias da Cena – Rodas de Conversa
26 de março, sábado, às 16h
Lançamento digital de acervo inédito do século XX no Portal Foco in Cena
Bate-papo presencial sobre fotografia e cena, com participação de Fernanda Vianna (Grupo Galpão), Suely Machado (1º Ato), Pedro Paulo Cava (Teatro da Cidade) e Marcos Coletta (Grupo Quatroloscinco + CPMT- Centro de Pesquisa e Memória do Teatro).
Local: Zap 18 (R. João Donada, 18 – Santa Terezinha)
Gratuito, aberto ao público